A indústria de conservas de peixe em Portugal
Por: Castro e Melo
Secretário-geral da ANICP- Associação Nacional dos Industriais de Conservas de Peixe

A história
Foi no início do século XIX, mais concretamente em 1804, que o francês Nicholas Appert descobriu o princípio da conservação dos alimentos pelo calor (esterilização), em recipientes hermeticamente fechados, o que permitiu um tempo de conservação até então nunca conseguido.
Estavam lançadas as bases da indústria de conservas, podendo mesmo afirmar-se que a indústria de conservas só após Appert se constituiu.
Todavia, é a partir do trabalho do inglês Peter Durand que a conserva conhece o seu formato definitivo.
Com efeito, ao patentear, em 1810, o invólucro metálico para as conservas, deixando de lado o invólucro de vidro de Appert, Drumond arranjou a forma de tornar a lata apropriada para a conservação de alimentos.
Havia, assim, nascido a conserva enquanto produto alimentar industrial e comercialmente exequível.
Este processo chamado de “appertização” (esterilização pelo calor), confere uma conservação perene à conserva e a possibilidade de acondicionamento num meio hermeticamente fechado, garantindo assim um produto seguro e de muito fácil confeção pois, no limite, basta abrir a lata e comer.
Há notícia de terem sido enviadas de Setúbal para a Exposição de Paris de 1855 conservas de sardinha em azeite, isto é, a instalação da indústria de conservas em Portugal tem de ser necessariamente anterior àquela data.
Ao tempo, terá sido a abundância de peixe, a extensão da linha de costa e a já então tradicional inclinação para as artes de pesca, que terão criado em Portugal condições favoráveis ao nascimento da indústria de conservas de peixe.
Diz-se que a indústria de conservas de peixe se instalou no nosso país pela mão de um industrial francês da Bretanha.
Desde sempre que Portugal teve uma grande tradição conserveira, cuja importância era, à época, medida em número de unidades fabris.
Assim, em 1884 já existiam 18 fábricas de conservas, que passaram a 66 em 1886, a 116 em 1912 e a 400 em 1925.
Em 1912, as 116 fábricas existentes empregavam cerca de 9.400 pessoas.
Atualmente, existem 20 unidades industriais de conservas em laboração, 17 no Continente e 3 na Região Autónoma dos Açores, que empregam cerca de 3.500 postos de trabalho de mão-de-obra direta, e outros tantos de mão-de-obra indireta, existindo zonas ribeirinhas no nosso país cujo emprego depende, em boa parte, das empresas de conservas aí instaladas.
A vocação exportadora da indústria portuguesa de conservas de peixe
O setor das conservas de peixe teve, desde sempre, uma vocação marcadamente exportadora, porventura não só devido às origens francesas da sua instalação no nosso país, mas também por ter compreendido, por antecipação, que o mercado interno era relativamente exíguo.
Por outro lado, a inconfundível qualidade das conservas de peixe portuguesas, aliada ao facto de serem um produto natural, sem corantes nem conservantes, de grande durabilidade de muito fácil confeção, preparadas com um profundo conhecimento e uma longa tradição, criaram no consumidor estrangeiro uma particular apetência para este produto.
Ora, é nesta sua dimensão internacional, que reside o interesse estratégico deste setor, enquanto contributo para a redução do deficit da nossa balança comercial, e uma vez que é o único subsetor, no sector dos produtos da pesca, que tem apresentado saldo positivo, ao longo dos anos.
Os principais destinos da exportação das nossas conservas têm sido França, Itália, Reino Unido, Espanha, Benelux, Áustria, Alemanha, Grécia, Suécia, Dinamarca e Polónia, isto na União Europeia, os EUA, Canadá, África do Sul, Suíça, Israel, Palestina, Japão, Brasil, China, Singapura, Austrália, Angola, Filipinas, Peru, etc., fora da União.
Mas a nossa indústria conserveira exporta, em maiores ou menores quantidades, para mais de 70 países, tendo sido ao logo dos mais de 150 anos do seu percurso, um verdadeiro embaixador e promotor de Portugal no mundo.
Em 2014, exportaram-se cerca de 54.249 toneladas de conservas de peixe, no valor de cerca de 208 milhões de euros.
Destas, cerca de 12.095 toneladas foram de conservas de sardinha, cerca de 13.797 toneladas de conservas de atum e cerca de 9.108 toneladas de conservas de cavala, todas elas nas suas variadas formulações, sendo estas as principais espécies produzidas e exportadas pela nossa indústria conserveira.
Mas, para além destas conservas, muitas outras se produzem e exportam, sendo que, atualmente, esta indústria fabrica mais de 700 referências, o que demonstra a enorme aposta na inovação e o grande salto na conceção de novos produtos.
O mercado interno
Óbvio que, neste contexto, não podíamos deixar de falar no nosso mercado interno, que embora pequeno representa, ainda assim, cerca de 35% das vendas do sector, tendo até vindo a crescer ultimamente.
O mercado interno ainda tem uma dimensão não desprezível, se lhe somarmos os volumes de conservas de peixe importados, e por isso os 35% de vendas das nossas conservas, no nosso mercado, são apenas uma parte dele.
Basta atender que, em 2014, se importaram cerca de 161 milhões de euros de conservas de peixe, sendo que, só de conservas de atum, foram cerca de 99 milhões de euros, importadas nas normalmente denominadas “marcas próprias” ou “marcas brancas”, da grande distribuição, as mais das vezes marcas portuguesas, enquanto que as nossas exportações de conservas rodaram os 208 milhões de euros.
Na verdade, as conservas que mais se consomem, quer no mercado interno, quer nos outros mercados, são as conservas de atum.
Ora, é bom de ver que uma boa parte destas conservas importadas bem poderiam ser produzidas pela nossa indústria, o que contribuiria não só para aumentar o emprego no setor, mas também para reduzir o deficit da nossa balança comercial.
(Continua)
Nota: Este artigo foi publicado na edição n.º 5 da Revista TecnoAlimentar, no âmbito do dossier Mar&Aquicultura.
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